Diocese de Uberlândia Em Destaque Reflexões Dominicais

05/04/2015: "Nas pegadas do 'passador'"

Comentário ao Evangelho da Páscoa do Senhor: Jo 20, 1-9

pegadas-na-areia1

“Ele andou por toda a parte fazendo o bem…” (At 10, 38); é esse o testemunho que recolhemos dos discípulos de Jesus, a seu respeito. O “passador da Galileia” como diria um teólogo famoso[1], expulsava o mal com sua presença sanante, porque Deus estava consigo e o havia ungido com o Espírito Santo e poder. Por onde Jesus passava, portanto, das periferias da Galileia aos centros de Jerusalém, seu percurso deixava pegadas cravadas no coração das pessoas, pois ele não só as punha de pé, firmes sobre a própria dignidade, mas também guiava seus passos num caminho prenhe de vida.

Mas, interromperam o percurso do mestre, pararam o passador, impediram-no de dar outro passo. Assassinaram aquele que só fazia o bem. E onde esteve Deus e seu Espírito naquele instante? De que ajudou a unção e a autoridade de Jesus, a mesma de que ele se valeu tantas vezes para realizar seus sinais?  Onde estavam os que diziam seguir os seus passos, senão longe de tudo aquilo que eles professavam e diziam amar? Por onde andaríamos nós, também, se a vida fosse um amontoado de descaminhos e desencontros; se tivéssemos perdido para sempre aquele que nos deu um norte, que plantou em nós o sonho de humanidade verdadeira?

Não é um perfeito retrato da alma humana, da humanidade, ou de todos aqueles que perderam o amor de suas vidas, a figura de Maria de Magdala, neste evangelho (Jo 20, 1-9)? Caminhar suportando o peso da noite, especialmente aquela que parece não ter fim, dentro da alma… Caminhar errante, à espera de que alguma luz imerja no horizonte e rasgue os véus pesados da escuridão que nos desbaratam e esmagam nossa esperança… Mas, e se todo caminho for o que o de Maria, nesse evangelho, parecer ser: dar um passo de cada vez em direção à morte, para contemplar ao fim, o fim de tudo?

Não nos bastariam túmulos abertos ou corpos sumidos para crer que há vida que vença a morte, especialmente quando percebemos que todos os nossos caminhos aguardam sua última palavra, o bramir de sua foice… Talvez precisássemos de algo mais, para crer que o túmulo vazio, como Maria o encontrou, anuncia ressurreição. Os dois discípulos que acorrem ao túmulo nos mostram o que é esse algo mais. À notícia de que o corpo havia sido roubado, Pedro entra no sepulcro, embora o outro discípulo tenha chegado primeiro. Os panos dão prova de que o corpo não foi roubado, pois estão cuidadosamente depostos, como o texto se preocupa em dizer. Então, o outro discípulo, entra no túmulo e vendo, crê. Dele, só se diz que Jesus o amava. Que será esse algo mais, que nos faz ver para além da morte, então, senão o amor? Sim, de novo ele; essa força que nos faz derramar toda lágrima em protesto contra a morte, mas que nos convida a olhar para além de todo túmulo e perceber que, aos olhos do amor, vazios estão todos os sepulcros[2]

E não nos poderíamos esquecer, afinal, que há Deus e que um de seus codinomes é, justamente, Amor. Amor que acolhe a morte do filho e a torna sinal de salvação para todos. Amor que se derrama como Espírito Vivificante sobre o Filho e o arranca das garras da morte, colocando-o ao seu lado direito (Cl 3, 2). Amor que vence a morte, fazendo das pegadas singelas de um pequeno galileu, um caminho de salvação universal. Amor que assume os nossos grilhões para quebrá-los e fazer-nos descobrir uma nova vida possível; autêntica e abundante, iluminada pelo sol da alegria e não vergada pelo peso da escuridão, distante do medo da morte e de suas tentativas de nos sepultar, mesmo antes que ela sobrevenha definitiva. Vida que saiba que a morte perdeu, de uma vez por todas, sua definitividade, ao lutar com alguém mais forte. Alguém onde a nossa vida, desde já, encontra-se escondida, até que chegue o dia em que apareceremos com ele, em sua glória…

________________

Por, Pe. Eduardo César

[1] A expressão é de Christoph Theobald, SJ; teólogo nascido na Colônia (Alemanha), professor de teologia no Centre Sèvres (Paris).

[2] A expressão é do estimado Frei Prudente Nery, ofmCAP, falecido em 2009, em Uberlândia; teólogo de argúcia incomparável.

Assine a nossa newsletter

Junte-se à nossa lista de correspondência para receber as últimas notícias e atualizações de nossa equipe.

You have Successfully Subscribed!