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"Eu não sabia que eu era tão importante para Deus"

Há pouco conclui uma série de quatro (4) aulas sobre o Livro da Aliança (Êxodo) no curso de iniciação à Fé da Paróquia Bom Jesus em Uberlândia-MG.

Na última aula, como faço em todos os términos de cursos que ministro, questionei aos presentes o que havia ficado. Pedi uma palavra, uma expressão, um entendimento. Enfim, uma síntese da Aliança de Deus com o Ser Humano. Do Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó que se revelou pai e senhor zeloso e ciumento de seu povo: “serei para vós um Deus e vós sereis para mim um povo” se “guardardes os meus mandamentos” e “não tiveres outro deus fora de mim”, advertiu o Santo de Israel.

De fato, a categoria basilar da Aliança é a Fidelidade entre Deus e o Ser Humano, uma vez que a relação existente entre ambos é de contrato esponsal; assim, Deus será sempre fiel ao seu povo, escolhido e eleito por Ele, livre e gratuitamente. E o povo, a fim de se manter na estreiteza do laço amoroso com o seu Go’el, deverá manter-se na fidelidade para com o seu “esposo” e redentor.

Mas, naquela última aula, eu provoquei os presentes. Porém, como sempre acontece, a maioria não falou; calou-se. Isso, para quem fala durante tantas horas, fica sempre um sentimento quase que de frustração, afinal, teria ficado alguma coisa? O que eu disse, foi compreensível? Ou foi tão rapidamente esquecido? Nada lhes tocou o coração?

Para não ficar no constrangimento, uma pessoa se colocou. Falou do amor de Deus e de outras categorias da Aliança. No entanto, a palavra de uma senhora lá no fundo da sala, dita de forma tão direta, desconcertou-me sobremaneira. Não sei o nome dela, não sei quantos anos tem nem o que faz. Sei, todavia, que ela sempre esteve presente às minhas aulas e, quando eu chegava, ela já se encontrava acomodada em seu lugar. Simples e discreta, talvez no auge de sua ancianidade, ali, generosamente pronta a me ouvir. Disse-nos, sem meias palavras: “Eu não sabia que eu era tão importante para Deus”.

DIA-INTERNACIONAL-DO-IDOSO

Aquela frase dita de forma tão direta impressionou-me sobremaneira, repito. E dita por alguém que experimenta a fé há tantos anos, a julgar pelos seus cabelos brancos e as marcas profundas em seu rosto, calmo e sereno, deixou-me em suspenso. Uma mulher que, penso, deve ter se esforçado muito para estar ali, sentada e atenta ao conteúdo programático, não obstante o cansaço do dia de labuta, o peso dos anos já vividos e, quem sabe, as dificuldades outras que se lhe apresentaram durante o curso e que eu, a bem da verdade, desconheço. Não saber-se “importante para Deus” é, talvez, uma constante na vida dos cristãos. E por quê?

Talvez por que não nos sentimos salvos pessoalmente por Ele; pessoalmente amados por Ele, eternamente desejados e incluídos na vida nova que Seu Filho nos conquistou graças à sua Fidelidade ao Pai e ao Reino do Pai. Quando nos diluímos na multidão dos eleitos, a gente se perde; explico. Quando Deus “nos” ama, “nos” salva e se revela a “nós” esse “nós”, se se antes não se encontrar com o “eu” pessoal, pode não se perceber também na dimensão eclesial que nos congrega em Igreja. A teologia chama isso de fides qua e fides quae, – a fé pessoal e a fé comunitária -. Se entre elas não houver íntima relação, aquilo que digo, ouço e vivo, na verdade, podem apenas transitar à margem da Fé e de Deus e eu, não me deixando mergulhar profundamente nessa experiência do encontro, apenas caminhar na praia, tocando o mar superficialmente, como quem molha somente os pés, ao invés de se deixar banhar por inteiro e poder atestar: “sim, eu sou particularmente importante para Deus”, como confidenciou-nos aquela senhora.

Enquanto o “nosso Deus” for um ideal “puro” de quem nos distanciamos justificando-nos “impuros”, podendo assim nos recolher em nosso comodismo, não poderemos, como Ele, salvar a ninguém; nem curar os corações feridos nem os cegos, os coxos e os surdos de nosso tempo. Esse modelo de deus não nos “serve” para nada; melhor seria “jogá-lo fora”. Um paradigma inalcançável nos tonteia, constrange e acomoda. E só. Ao passo que um referencial possível, questionador e encarnado, movimenta-nos e nos desinstala a ponto de, fazendo como Ele, deixar-nos persuadir por aquele amor que transfigura as realidades de morte ainda existentes.

Por fim, saber-se “tão importante para Deus” é descobrir, dentre outras coisas, que a vida que agora vivo pode receber um plus ainda não tocado; e isso é magnifico. Aquela expressou quase que de espanto e de admiração, como se encontrado “um tesouro”, calou forte dentro de mim. Não deveríamos todos também ousar tamanha descoberta, sincera e honestamente?

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Por, Claudemar Silva

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