Orientações para as eleições 2020
Dom Paulo Francisco Machado
Bispo Diocesano
“Por falta de direção um povo se arruína” (Pr 2,14)
Ao aproximarmo-nos das eleições municipais, tendo em vista a importância de que elas se revestem no atual momento histórico, sinto o dever de apresentar algumas orientações aos irmãos e irmãs que comungam da mesma fé em Cristo e são membros da Igreja, cuja sede se encontra em Uberlândia.
Vivemos dias calamitosos pelos efeitos deletérios da Pandemia provocada pelo novo coronavírus: famílias enlutadas; hospitais repletos de pessoas acometidas pelo covid-19; um número nunca visto de desempregados; solidão lancinante de gente reclusa em suas residências, muitas vezes verdadeiros barracos; restrições às mais justas e saudáveis manifestações de afeto; escolas fechadas com a dificuldade da grande maioria do alunado de acessar a internet; igrejas sem ou com participação mínima de fiéis aos atos litúrgicos, etc..
Da Sagrada Escritura e, em especial dos Evangelhos, aprendemos como Povo de Deus a lançar nosso olhar carregado de esperança para Deus, no qual reconhecemos, na ousadia permitida por Jesus e por obra do Espírito Santo de chamá-Lo de Pai, meu e de meus irmãos. É justamente da oração do Senhor que haurimos a força de prosseguir no Caminho da Esperança “que não decepciona” (Rm5,5) e, atender aos apelos de fraternidade.
A participação na vida política como eleitor é sempre recomendada pela Igreja, uma vez que, no interesse pela coisa comum, o voto consciente elege os candidatos verdadeiramente dispostos e capazes de edificar a tão almejada sociedade justa e fraterna. Houve até mesmo quem afirmasse que, “politizar o mundo, é o mesmo que fraternizá-lo”. Será preciso insistir em bordão muito citado há alguns anos, mas sempre oportuno: “VOTO NÃO TEM PREÇO TEM CONSEQUÊNCIA”.
O Papa Francisco tem insistido na importância da participação do cristão na política e que não nos é permitida omissão nesse campo da vida social, e afirma: “Um bom católico deve empenhar-se na política, oferecendo o melhor de si, para que o governante possa governar” e, insiste:” “A política é uma atividade nobre. É preciso revalorizá-la, exercendo-a com vocação e uma dedicação que exige testemunho, martírio. Ou seja, morrer pelo bem comum“.
Na escolha dos candidatos há que se levar em conta, entre outros elementos: 1. Que seja pessoa formada pelos valores do Evangelho; 2. Que tenha como projeto o cuidado com nossas maiores necessidades: respeito à vida da pessoa humana do seu início ao seu término natural, compromisso de gerar postos de trabalho, melhoria do sistema de saúde e defensor do SUS, esgotamento sanitário, transportes, cuidado com o meio ambiente; 3. Que favoreça aquelas políticas públicas destinadas ao bem comum, e que tenha compromisso com a verdade e repudie a mentira (“fakes News”).
No decorrer dos últimos anos a Igreja, através da Campanha da Fraternidade, vem chamando a atenção para alguns de nossos compromissos e que, portanto, são compromissos dos candidatos merecedores de nosso voto. Cito alguns deles, reportando-me aos temas das últimas campanhas e que afetam em muito a realidade dos municípios da Diocese de Uberlândia. Fraternidade e: Pessoas idosas; Água; Solidariedade; Pessoas com deficiência; defesa da vida; Segurança Pública; Saúde Pública; Biomas Brasileiros; Superação da Violência; Políticas Públicas; a Vida, dom e compromisso e, para o próximo ano, Diálogo, compromisso de amor.
Dirijo-me agora aos Candidatos
A palavra “candidato” reporta-nos ao conceito de pureza, de reta intenção. A Igreja reconhece nas autoridades civis a dimensão de serviço, e serviço necessário para a cidade. Assim se expressa o Concílio Vaticano II: “A Igreja louva e aprecia o trabalho de quantos se dedicam ao bem da nação e tomam para si o peso de tal cargo, em serviço dos homens” (GS,75). E o Catecismo da Igreja Católica, obra inspirada no mesmo concílio, afirma; “A iniciativa dos cristãos leigos é particularmente necessária quando se trata de descobrir, de inventar meios para impregnar as realidades sociais, políticas, econômicas com as exigências da doutrina e da vida cristãs” (nº899). O candidato deve entender sua função como serviço ao Bem Comum.
É acirrada a disputa pelo voto dos eleitores, o que muitas vezes leva o candidato a fazer uso de recursos nada louváveis, às vezes imorais e até mesmo, completamente ilegais e sujeitos a penalizações. Fica proibido o uso de imagens de membros do clero para efeito de propaganda, uma vez que pela lei eclesiástica nos é vedado inscrição em partido político e, conquanto tenhamos a responsabilidade de promover o bem comum, esse é vocacionado para o serviço da evangelização e santificação dos fiéis. O padre é o homem da COMUNHÃO, termo que dá nome ao momento culminante do exercício sacerdotal, realizado em nome de Cristo.
Os leigos e leigas que, competentes, se sintam inclinados a esta “nobre arte” (Pio XI), ao se tornarem candidatos (as), compromissados com o bem comum, não podem, no exercício de ministérios eclesiais, fazer propaganda de sua candidatura, portando vestes, bótons e, a critério do pároco, pode ter seu precioso ministério suspenso temporariamente até o término das eleições.
Ainda desejo dirigir-me aos candidatos verdadeiramente interessados no bem comum, com o texto do Cardeal vietnamita Francisco Xavier Nguyen Van Thuan, reproduzido pelo papa por ocasião do 52º Dia Mundial da Paz (2019):
“Bem-aventurado o político que tem uma alta noção e uma profunda consciência do seu papel.
Bem-aventurado o político de cuja pessoa irradia a credibilidade.
Bem-aventurado o político que trabalha para o bem comum e não para os próprios interesses.
Bem-aventurado o político que permanece fielmente coerente.
Bem-aventurado o político que realiza a unidade.
Bem-aventurado o político que está comprometido na realização duma mudança radical.
Bem-aventurado o político que sabe escutar.
Bem-aventurado o político que não tem medo”.
Clero
O Clero tem proibição expressa de filiação a um partido político pela lei eclesiástica. Assim o Código se exprime: “Os clérigos são proibidos de assumir cargos públicos que implicam participação no exercício do poder civil” (Cân. 285 par.3); mais adiante, “não tenham parte ativa nos partidos políticos e na direção de associações sindicais, a não ser que, a juízo da competente autoridade eclesiástica, o exijam a defesa dos direitos da Igreja ou a promoção do bem comum” (Cân 287 par. 2).
Os motivos para tal proibição são vários: 1. Sob o aspecto Cristológico, lembremo-nos do processo contra Jesus diante de Pilatos a afirmar que o seu reino não tem a mesma natureza dos poderes terrenos. A sensibilidade para com os pobres tantas vezes manifestada por Jesus (Cura dos doentes, multiplicação dos pães) também deve ser própria dos servidores da Igreja, mas não nos é permitido fazer do púlpito um espaço para a propaganda político-partidária. 2. Sob aspecto Pastoral, tenhamos em conta que, como pastores das ovelhas do Senhor Jesus, somos chamados a zelar pela unidade do rebanho que nos foi cofiado, neste momento de grande polarização política nas nossas cidades e no país inteiro. 3. Sob o aspecto Eclesiológico, tenhamos em conta, que durante anos fomos formados para nos tornarmos servidores do povo de Deus, para prestar um serviço eclesial. A nossa formação tão esmerada foi custeada, em geral, pelos pobres que esperam de nós o conforto de palavras de esperança e o alimento, o Pão da Vida, para enfrentarmos a caminhada pelo deserto da vida até chegar à meta, o Reino Definitivo.
Ainda, quero recordar, que a Justiça eleitoral tem suas normas, entre elas a proibição de propaganda eleitoral nos templos. Publicidade e “outdoors” só são permitidos nas sedes dos partidos políticos ou nas fachadas dos comitês da campanha.
Pertence sim à nossa missão dar aos fiéis a devida formação inspirada na Palavra de Deus e no riquíssimo ensinamento da Doutrina Social da Igreja, e isso de forma orgânica e continuada.
Que nos proteja a Mãe de Deus e nossa, aqui amada e venerada sob os títulos de “Senhora Aparecida” ou “Senhora da Abadia”.
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