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Profissionais da Saúde contra a COVID 19: entre a tensão e a exaustão, por Dom João Bosco Óliver de Faria

PROFISSIONAIS DA SAÚDE CONTRA A COVID 19: ENTRE A TENSÃO E A EXAUSTÃO

 

+ João Bosco Óliver de Faria

Arcebispo Emérito de Diamantina

Presidente da Pró Saúde

 

                   Um esportista pratica habitualmente seu esporte para aperfeiçoamento pessoal e para manter e revigorar sua forma física. Quando chega o momento das competições, que visam, entre outros objetivos, a proporcionar lazer ao público, estas são antecedidas por rígido protocolo: concentração dos esportistas em local apropriado, amparo médico, psicológico, alimentar e técnico para se obter a maior eficiência possível de cada um e da equipe. Há por parte de todos os envolvidos tensão pela responsabilidade para com sua equipe e para com seu espaço específico na competição. As transmissões dos jogos mostram, claramente, o desgaste físico e psicológico de todo atleta ao final de cada partida. Isso demanda um tempo de recuperação física e psíquica dos jogadores, antes de serem confrontados em uma nova competição que, terá, por sua vez, uma nova e cuidadosa preparação. É tudo muito merecido por aqueles que oferecem a todos nós um agradável lazer!

            As pessoas que trabalham na área da saúde, combatendo a COVID 19, sobretudo médicos, médicas, enfermeiros, enfermeiras e auxiliares de enfermagem, têm enfrentado uma competição muito mais violenta e superlativamente de maior responsabilidade. Seu objetivo não é proporcionar lazer, mas salvar vidas humanas. Trabalham, expondo permanentemente ao risco sua saúde e vida. O Conselho Federal de Medicina registra 465 médicos mortos pela COVID 19 e o Conselho Federal de Enfermagem contabiliza 525 vítimas (dados não atualizados).

            Não nos esqueçamos de que cada pessoa é única, irrepetível e insubstituível. Percebemos essa realidade mais materializada ao pensarmos na pessoa de nossos pais: eles são únicos, sem repetição e ninguém os substitui para nós.

            Sendo única, cada pessoa tem um significado e uma história de vida, quer no aconchego de sua família, quer no concerto da sociedade de que faz parte. Sua ausência definitiva significa, pois, um vazio irreparável que nenhum monumento construído em sua homenagem seria capaz de resgatar.

            Essa verdade fervilha na mente e no coração do profissional da saúde que, diante do desafio de vida e de morte, não joga a toalha, mas luta até os limites da ciência e de suas forças pessoais, para salvar a vida de seus semelhantes.

               Verificamos, no entanto, sem culpa ou responsabilidade dos primeiros, uma inversão de valores, assumida em plano internacional. Enquanto o esportista tem duas ou três competições importantes por semana, o profissional da saúde tem muitíssimas por dia. O cronômetro tem limites para o esportista, mas não o tem para o profissional da saúde, girando, para este com uma velocidade bem maior, porque a vida se esvai numa fração de segundos. Contrariamente também à situação do esportista, não há um ambiente confortável de concentração para os profissionais da saúde, nem amparo médico (paradoxo), psicológico, alimentar e técnico! Não há intervalos de descanso entre as competições; estas se multiplicam, sem limites e descontroladamente, nesta pandemia.

            Conforme relatam os meios de comunicação social, não há um ambiente de trabalho adequado, nem o suporte técnico necessário para o exercício eficaz da medicina. É um permanente remar contra a correnteza. Enquanto no esporte o clima é de alegria, que embala e incentiva os atletas, nos hospitais multiplicam-se as lágrimas de desespero e de dor que brotam dos olhares tristes, angustiados e desesperançados dos parentes, diante daqueles que tentam salvar vidas.

            Os “anjos” de branco, de azul ou de verde, não são anjos. São humanos! Têm suas famílias – com seus desafios –, que ficaram privadas de suas presenças; quando voltam as suas casas, a desoras, nem podem, de imediato, abraçar seus queridos! Muitos pais e mães nem podem ver seus filhos pequenos acordados, que sucumbem ao cansaço de esperá-los para colocá-los para dormir.

            Se os noticiários são fidedignos, assistimos ao estresse se sobrepor ao caos: há, nos hospitais, uma demanda em crescimento geométrico frente ao desaparecer progressivo dos recursos básicos de vida. Os senhores médicos/as, enfermeiros/as sabem o que devem fazer. Não lhes falta a ciência teórica nem a sabedoria de sua aplicação. Entretanto, faltam-lhes, muitas vezes, insumos e suprimentos para cumprir seu papel. Além disso, o tsunami da doença nada respeita e varre impiedosamente de suas mãos vidas agonizantes!

            Vendo filhos que choram os pais, pais que choram os filhos, coveiros que choram curvados diante da dor e da sobrecarga do ofício, vêm-me à lembrança os versos de Castro Alves, ao comentar as barbaridades do tráfico de negros, nos navios de Portugal, em seu poema O Navio Negreiro: Dizei-me, Vós, Senhor Deus! se é loucura…  se é verdade tanto horror perante os céus!

            Essa é a cena de cada dia diante dos olhos dos profissionais da saúde. Eles terminam cada dia com lágrimas amargas nos olhos, para, após uma noite, tantas vezes mal dormida, retornar ao vale do sofrimento. Trata-se de um desgaste humano imensurável. Nos hospitais, cada um chora seu parente; os médicos/as, enfermeiros/as e auxiliares choram todos os que sofrem diante de seus olhos!

            Felizmente são muitos os curados que voltam radiantes para os seus lares, bendizendo a Deus e agradecendo àqueles que se sacrificaram por sua saúde. A cura dos enfermos é a consolação dos que a eles se dedicam. Eles/as veem a vitória da saúde sobre a doença e da vida sobre a morte, mas o preço do desgaste humano para fazer sucumbir a doença e evitar a morte não deixa de pesar.

            Como é bonito ver esses profissionais, que, de mãos unidas, elevam ao Senhor da História a oração de toda a humanidade: Pai Nosso que estais nos céus, santificado seja o Vosso nome, venha a nós o Vosso reino, seja feita a Vossa vontade assim na terra como nos céus… mas livrai-nos do mal do coronavírus. Amém.

            Rezemos nós também, com eles e por eles, para que, ainda que exaustos, não desanimem jamais e tenham força física e espiritual para continuar esta partida com prorrogação indefinida, devolvendo aos que deles necessitam a saúde e a alegria de viver!

            Não cabe a mim, pela minha pequenez, agradecer por aqueles beneficiados pelos seus trabalhos. Senhores Médicos, Senhoras Médicas, Senhoras e Senhores Enfermeiros, Enfermeiras e Auxiliares de Enfermagem, Deus, que recompensa um copo de água dado em Seu Nome, saberá recompensar, na medida de Sua Misericórdia Infinita, aos senhores, e às senhoras e a suas famílias todo o bem que, sob suas orientações, está sendo realizado! Amém!

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